‘Ley de Seguridad Ciudadana’, ou como o Estado se petrecha para reprimir a mobilizaçom social e política nos próximos tempos

Lei Mordaça, Lei da pancada na boca ou Lei anti-15M som três das denominaçons com que foi baptizado o ante-projeto de Ley de Seguridad Ciudadana aprovado no Consejo de Ministros do 28 de novembro. À espera da tramitaçom parlamentar, que dará luz verde à iniciativa vista a maioria de que desfruta a extrema direita no Congresso espanhol, o ante-projeto é a generalizaçom da penalizaçom da mobilizaçom social e o reforço do monopólio estatal da violência.

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Assim, o Consejo de Ministros espanhol fixa na lei que substituirá à atual Ley sobre Protección de la Seguridad Ciudadana –conhecida como Lei Corcuera, ou Lei da pancada na porta, de 1992- umha bateria de infraçons muito graves (7), infraçons graves (31) e infraçons leves (20) sancionáveis com margens de extorsom económica que, respetivamente, vam de 30.001 a 600.000, de 1.001 a 30.000 e de 100 a 1.000 euros, que colocam no alvo o protesto social.

1-  ANÁLISE DO ANTE-PROJETO

O ante-projeto, além de reforçar as amplas margens de arbitrariedade de que desfrutam os corpos policiais e generalizar a repressom económica às novas e velhas modalidades de contestaçom social, introduz a novidade de substituir o que antes eram processos penais -juízos-, com certas possibilidades de controlo jurídico, por sançons administrativas em que a versom policial e governamental dos acontecimentos é sempre o fator concluinte.

A análise pormenorizada dos novos tipos delitivos nom deixa lugar à dúvida sobre a sua intencionalidade político-repressiva. Trata-se de fixar um marco punitivo acompanhado com repressom económica dirigida ao protesto e a mobilizaçom social. Deste modo, umha vez retiradas do ante-projeto as sançons ligadas à perseguiçom da pederástia, o tráfico de drogas, a violência machista, etc., que se mesturam calculadamente com o exercício da liberdade de expressom e o protesto social, fica a radiografia política da iniciativa.

INFRAÇONS MUITO GRAVES

Os comportamentos que o Governo espanhol tipificará no sucessivo como “muito graves” a iniciativa do Ministerio de Interior serám sancionados com multas de 30.001 a 600.000 euros. Nesta categoria englobam-se práticas como as seguintes:

Convocatória e assistência a manifestaçons com finalidade coativa e inobserváncia da legislaçom eleitoral desde a finalizaçom da campamha eleitoral até o fim da votaçom.

– Perturbaçom “muito grave” da ordem em atos públicos, desportivos, culturais, espetáculos, ofícios religiosos ou outras reunions numerosas.

– Reunions o manifestaçons nom comunicadas ou proibidas em lugares que tenham a consideraçom de infraestruturas críticas como centrais nucleares ou aeroportos, assim como a intrusom nos seus recintos, incluindo o seu sobrevó e a obstruçom do seu funcionamento.

– Celebraçom de espetáculos públicos ou atividades recriativas quebrantando a proibiçom ou suspensom ordenada pola autoridade.

 

INFRAÇONS GRAVES

Esta categoria agrupa 31 novos tipos delitivos, todos sancionáveis com multas que abalam de 1.001 e 30.000 euros. Deste grupo, se excluimos as penalizaçons referidas ao exercício da liberdade sexual, o consumo de substáncias psicoativas, a possessom ou emprego de armas, etc., vinte novas tipologias delitivas estám focadas a reprimir práticas habituais no marco de qualquer conflito  social:

Concentraçons nom comunicadas ante instituiçons do Estado como o Congresso, o Senado, os parlamentos autonómicos ou os altos tribunais, embora nom tenham atividade e quando se perturbe a segurança cidadá.

Perturbaçom grave da ordem em atos públicos, desportivos, culturais, espetáculos, ofícios religiosos ou outras reunions numerosas.

Alterar a ordem pública encarapuçad@ ou com qualquer elemento que dificulte a identificaçom.

Desordes graves na via pública ou provocar incêndios que representem um perigo para as pessoas ou bens.

Obstruir à autoridade na execuçom das suas decisons administrativas ou judiciais, como nos despejos.

Desobediência ou resistência à autoridade ou aos seus agentes no exercício das suas funçons e a negativa a identificar-se.

Perturbaçom da ordem em campanha eleitoral.

Manifestaçons e reunions sem autorizaçom ou que infrinjam a lei de reuniom e a negativa a disolver as acordadas pola autoridade. Também quando se produzam em centrais nucleares, aeroportos, etc.

Ofensas ou aldragens a Espanha, às comunidades autónomas e entidades locais ou às suas instituiçons, símbolos, hinos ou emblemas, efetuadas por qualquer meio.

Obstruir inspeçons e contróis regulamentares em fábricas, locais e estabelecimentos.

Justificar o terrorismo, a xenofobia e a violência contra a mulher, como a exibiçom de fotos de terroristas.

Falta de colaboraçom com a Polícia na averiguaçom ou prevençom do delito.

– O garrafom, quando perturbar gravemente a tranquilidade cidadá e nom esteja autorizado.

– Os danos graves a mobiliário urbano como marquesinas, papeleiras ou contentores, assim como os atos vandálicos a serviços públicos, para além de obstaculizar a via pública com viaturas, contentores ou pneumáticos.

Escalar como açom de protesto em edifícios públicos.

INFRAÇONS LEVES

Esta última categoria de tipos delitivos sancionará-se segundo o ante-projeto de lei com multas que vam de 100 a 1.000 euros. Se bem se tratar das sançons mais benignas das expostas, a sua simples imposiçom supom para qualquer economia pessoal ou familiar assalariada umha gravíssima extorsom económica. Neste apartado, o Consejo de Ministros agrupa:

Manifestaçons e reunions que infrinjam a lei de reuniom.

– Exibiçom de objetos perigosos com ánimo intimidatório.

Incumprir restriçons de circulaçom peonal ou itinerário com ocasiom dum ato público, reuniom ou manifestaçom.

Ameaçar, coacionar, vejar e injuriar aos agentes das forças de segurança quando estejam velando pola mantença da ordem pública, por exemplo em manifestaçons ou outro tipo de protestos, e a gravaçom e difusom das suas imagens que atentem contra o direito ao seu honor ou a sua imagem e que podam por em perigo a sua segurança ou a da intervençom policial.

– Ameaças, coaçons, injúrias ou vejaçons em vias públicas.

Injúrias ou calúnias através de qualquer meio de difusom às instituiçons, autoridades, agentes e empregados públicos, assim como a falta de respeito.

– A ocupaçom de qualquer espaço comum, público ou privado e a colocaçom de tendas de campanha ou tenderetes sem permisso na rua.

– Perder três vezes ou mais o bilhete de identidade num prazo de 5 anos e a negativa a entregar este documento quando se acordasse a sua retirada.

– Os danos leves a mobiliário urbano como marquesinas, papeleiras ou contentores, assim como os atos vandálicos a serviços públicos, por exemplo, as pintadas e os grafitti.

– Entorpecer a circulaçom peonal.

Escalar a edifícios ou monumentos ou lançar-se desde eles.

– Retirar os valados da Polícia que delimitam perímetros de segurança.

 

2-  ELEMENTOS DE VALORIZAÇOM

A valorizaçom desta iniciativa governamental é inseparável do contexto de crise que vive o Reino de Espanha e da vontade do Executivo de Madrid de sorteá-la procedendo a umha pauperizaçom generalizada das sociedades que se encontram sob o quadro jurídico-político espanhol e um corte geral de liberdades e direitos. Assim,

Colocam-se no ponto de mira todas as modalidades novas e velhas de protesto. O impedimento coletivo de despejos, a exibiçom de fotos de presos ou presas políticas, a ocupaçom popular do espaço comunitário (acampamentos, sentadas, etc.), as mobilizaçons ante instituiçons, o  bloqueio da circulaçom rodada, a colocaçom de faixas em edifícios oficiais, etc. passam a ser sancionáveis.

Generaliza-se a arbitrariedade na tipificaçom e sançom dos delitos. O ante-projeto de lei aparece inçado de termos como “finalidade coativa”, “perturbar”, “grave”, “muito grave”, “vejar”, “injuriar”, “justificar”, “caluniar”,  etc. que nom som objetivos nem aparecem regulamentados em nengures e estám sujeitos à interpretaçom.

Decide o Governo espanhol e os corpos policiais em vez de a Justiça. O facto de que o que antes eram sançons penais, sujeitas a um certo controlo jurídico, passem a ser agora administrativas, com plena capacidade de decisom para a Delegación del Gobierno de España na Galiza e os corpos policiais, evidencia até que ponto é a política governamental a que se pujo na ponte de mando na execuçom das sançons nenguneando a Justiça espanhola.

Máxima proteçom legal para a impunidade policial. A iniciativa do Ministerio de Interior, que prevé a curto prazo o repotenciamento da repressom ante os protestos que dessatam em todo o território estatal, blinda de impunidade a violência policial. Assim, poderá-se sancionar com até 1.000 euros a “gravaçom e difusom” de imagens que “atentem contra o direito ao seu honor ou a sua imagem”, é dizer, converte-se em delito dar testemunho gráfico da brutalidade que em muitas ocasions acompanha as cargas policiais e impede-se que a versom das pessoas agredidas poda apoiar-se em material gráfico (fotos, vídeos, etc.) numha eventual denúncia penal. Recentemente, o Secretario de Estado para la Seguridad Francisco Martínez, ante as críticas geradas por esta modificaçom, declarou que a imposiçom de sançons neste caso só se aplicará quando a filmaçom de imagens tenha vontade “mal-intencionada, lesiva e agressiva”, isto é, de novo a interpretaçom subjetiva dos factos.

Reforça-se a monopólio estatal da violência. Enquanto se blinda o exercício da violência polos corpos repressivos, alegando o seu “direito à imagem” e o seu “direito ao honor” como estratégia para imunizá-los, todas as modalidades de resposta a essa violência, que som comuns por exemplo nos conflitos laborais, submetem-se a um estrito e inibidor sistema de penalizaçons. A  Delegación del Gobierno de España na Galiza converte-se em árbitro absoluto do protesto social, decidindo sobre concessom de permissos, autorizaçons, emprego da violência policial, imposiçom de sançons, cargas, detençons, etc.

Combina-se a impunidade da violência policial com a expansom da repressom económica. O Governo espanhol dá luz verde ao exercício da violência policial enquanto define um marco legal para o protesto e a mobilizaçom similar a um campo de minas, onde qualquer comportamento é interpretável polas Fuerzas y Cuerpos de Seguridad del Estado e penalizável. A generalizaçom da repressom económica persegue aliás impor a parálise da mobilizaçom popular frente às políticas antisociais de Madrid e a Troika.

Criminaliza-se a solidariedade com as/os presas/os políticas/os. O Governo espanhol, após o Tribunal Supremo dirimir recentemente que a exibiçom de imagens de militantes presos ou presas “nom é enaltecimento do terrorismo”, sempre e quando esta nom se associe a emblemas ou consignas próprios de organizaçons ilegais, volve à carga para penalizar este aspeto da solidariedade e tipifica-o como “infraçom grave” sancionável com até 30.000 euros. A via jurídica reabrirá-se de novo para botar abaixo este conteúdo específico da lei num momento em que no nosso país há 26 processos abertos por este “motivo”.

Espanha face o fascismo. De sempre, o regime resultante da maquilhagem pactuada da ditadura nunca foi equiparável a umha democracia burguesa ocidental, dada a preminência do poder militar sobre o político, a nom-separaçom de poderes, o emprego sistemático da tortura, a corrupçom estrutural do Estado, a existência dumha Ley de Partidos para amordaçar a dissidência política legal, etc. A próxima aprovaçom dumha bateria de medidas legais que situa na ilegalidade de facto a contestaçom às políticas do Governo espanhol e o questionamento do seu projeto nacional é umha nova volta de porca no aprofundamento da condiçom fascista do Estado espanhol. Incluso um organismo internacional como a OSCE situa o Reino de Espanha ao nível de Uzbequistám, Albánia ou Sérbia quanto ao estado em que se encontra o exercício do “direito de reuniom e manifestaçom”.

3-  PROCURANDO ALTERNATIVAS

O Estado espanhol, com umha nula capacidade para o diálogo e a resoluçom pacífica dos conflitos que o percorrem ao longo da sua história, foi sempre dado a vias violentas, repressivas e impositivas. O ante-projeto de lei enquadra-se à perfeiçom nesta tradiçom autoritária tam espanhola: castigar o povo para fazer aplicáveis políticas lesivas para este.,

Desde os movimentos populares galegos e, em especial, desde o campo anti-repressivo, urge  adoptar medidas que minimizem os efeitos paralisantes que esta lei pretende ter sobre a auto-organizaçom e a mobilizaçom popular. Como achega de urgência, à vista da nossa já longa experiência na gestom da repressom administrativa, sugerimos umha série de questons imediatas:

1º Ativistas e militantes devem evitar na medida do possível ter a nome próprio propriedades, contas de poupança, etc. que podam ser espoliadas polo Estado em processos de repressom administrativa. A co-responsabilizaçom coletiva no abono de sançons económica  ou a insubmissom ao pagamento som vias a explorar no futuro imediato.

2º O Desenvolvimento de dinámicas anti-repressivas amplas, com equipas de advogadas/os e capacidade de mobilizaçom e denúncia social da repressom, assim como a constituiçom de Caixas de Resistência frente a à extorsom económica, convertem-se desde agora numha necessidade de primeira ordem para enfrontar os efeitos da Ley de Seguridad Ciudadana.

3º Proceder a umha caraterizaçom sistemática do Estado espanhol como estado nom democrático que, para impor as suas políticas antisociais ao serviço da oligarquia que o rege, procede a um corte geral de liberdades públicas e à repotencializaçom do fascismo nas ruas.

4º A filmaçom e difusom social da violència policial devem adoptar novas modalidades que garantam a proteçom e a segurança das pessoas que a praticam. As novas tenologias oferecem imensas possibilidades para sortear o cerco policial e manter a política de denúncia e socializaçom da repressom.

5º Ante a evidência de que qualquer pessoa socialmente comprometida que figure nas “listagens pretas” dos corpos repressivos pode ser acusada por agentes policiais de “injuriá-los” ou “caluniá-los”, chegando apenas a “palavra” dum polícia, a procura de formas coletivas de ocultaçom da identidade pode ser no futuro imediato umha medida para esquivar a açom repressiva.

4-  CONTINUAR AS LUITAS

A próxima aprovaçom da Ley de Seguridad Ciudadana delimita um novo terreno de jogo para as organizaçons e os movimentos populares na Galiza, mais complexo, e menos democrático. Temos a certeza no entanto de que, igual que aconteceu com iniciativas legislativas similares no passado, será incapaz de apagar a capacidade de luita deste povo e, contra o que desejam quem a implementam, reforçará essa vontade coletiva e a consciência de que o espanhol é um Estado em queda livre face o fascismo do que devemos liberar-nos quanto antes.